Importância da democratização da saúde feminina nas escolas públicas de Mato Grosso

Cerca de 4 milhões de mulheres nunca se consultaram com um ginecologista

O acesso à informação sobre saúde feminina ainda é limitado a muitas mulheres. Pelo fato do assunto ser considerado “tabu” em algumas famílias, jovens e adolescentes estão mais vulneráveis à pobreza menstrual, infecções sexualmente transmissíveis (IST) e gravidez precoce.

Segundo a pesquisa realizada em 2019 pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) em parceria com o Datafolha, revelou que cerca de 4 milhões de mulheres nunca foram a uma consulta ginecológica. Número preocupante, visto que isso impacta diretamente na qualidade de vida de milhares de mulheres.

Nesse sentido, a escola tem um papel fundamental na democratização da saúde feminina, a fim de minimizar os efeitos da falta de acesso na vida da mulher. Uma das iniciativas desenvolvidas pelo Governo Federal, foi o Programa de Saúde na Escola (PSE) que visa a integração e articulação permanente da educação e da saúde.

Na prática, o PSE funciona através da negociação entre secretários municipais de saúde e educação com os Ministérios da Saúde e da Educação, e que se caso seja realizada, tem a duração de dois anos na unidade de ensino.

O público prioritário para participar do programa são: estudantes de escolas públicas, escolas rurais, escolas com alunos em medida socioeducativas e escolas que tenham pelo menos 50% dos alunos matriculados pertencentes a famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família. Ou seja, nem todas as escolas podem participar.

Falta de assistência do governo

Na Escola Estadual Historiador Rubens de Mendonça, a coordenadora Kátia Arruda, conta que a instituição não é beneficiada pelo programa, e que o único atendimento prestado às alunas, é a distribuição de absorventes durante o período das aulas.

“Aqui na nossa escola não tem esse programa, então a única coisa que conseguimos fazer é a distribuição de absorventes no momento em que a menstruação ocorre aqui dentro. Elas só recebem para usar aqui, não levam pra usar em casa”, conta a coordenadora.

Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

A escola, que fica localizada na região periférica da capital mato-grossense, possui alunas com faixa etária de 10 a 18 anos, idade que geralmente ocorre a primeira menstruação e início da vida sexual. Momento esse, que surgem diversas dúvidas, as quais não são respondidas para as alunas da instituição.

“Eu acho de extrema importância que esse programa chegue até a nossa escola, as nossas alunas precisam dessas orientações. Elas estão na fase de muitas dúvidas sobre esses assuntos, e sinto que elas estão desprotegidas sem essas informações”, aponta Kátia.

Projeto leva informação à comunidade

No Brasil, o projeto Girl Up busca fomentar a liderança feminina jovem, principalmente de adolescentes. Isso acontece com a formação de clubes dentro da organização, que identificam os problemas mais pontuais de suas comunidades, com o objetivo de trazer soluções para eles.

Foto: Assessoria Girl Up – Tereza de Benguela

Em Mato Grosso, o clube Girl Up – Tereza de Benguela é o primeiro do estado, e possui no total 11 membros ativos. A líder do grupo, Isabela Zebina, explica que a cada ano os objetivos do projeto mudam, e que no ano passado, era ampliar os debates sobre pobreza menstrual em Cuiabá, organizando palestras em escolas públicas da cidade.

Diante todas as escolas visitadas, a pobreza menstrual era algo real e estava presente na comunidade das alunas. Isabela conta que ao questioná-las sobre formas de substituir absorventes, como uso de meias, miolo de pão e até mesmo folhas de árvores, muitas levantaram a mão, afirmando que fizeram ou conhecem alguém que faz uso desses outros métodos.

“A gente sempre perguntava se elas conheciam alguém próximo, que faziam uso desses outros métodos, até para não intimidá-las nas respostas. E várias levantavam as mãos afirmando que sim”, frisa Isabela.

Profissionais atuantes dentro das escolas

A enfermeira escolar do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT) Jessica Rodrigues, é uma das únicas profissionais que ocupam esse cargo em uma unidade escolar pública de Mato Grosso, e conta como são realizados os atendimentos na instituição.

“Ainda não trabalhamos com atendimento individualizado, mas promovemos atividades em grupo que buscam alcançar as diferentes questões relacionadas à saúde dos estudantes, principalmente das meninas, com assuntos sobre a saúde feminina”, explica a enfermeira.

Foto: Alexia Oliveira

Na instituição, através de rodas de conversas, Jessica aborda principalmente temas como a IST e gravidez precoce, que segundo ela, apesar das orientações, ainda é algo recorrente na fase da adolescência, comprometendo o processo educacional das estudantes.

Outro ponto destacado pela profissional, é a importância de atingir mulheres LGBTQIA+ nas discussões, como por exemplo as meninas lésbicas, já que o grupo ainda é discriminado por muitos profissionais de saúde.

“Aqui na instituição também conseguimos atingir as meninas LGBTQIA+, porque independente delas terem relações homoafetivas, elas possuem aparelho reprodutor feminino e correm os mesmos riscos. É comum nos atendimentos com profissionais de saúde, na hora que a mulher diz ‘sou lésbica’, não são orientadas nem a fazer o exame preventivo”, pontua Jessica.

Contudo, ela também destaca os desafios na discussão das temáticas, principalmente pelo fato dos pais e responsáveis acharem que ao ser abordado esses assuntos dentro da instituição, de alguma maneira irá promover a iniciação sexual das adolescentes. Porém como profissional, Jéssica afirma que é ao contrário, quanto mais informações elas recebem, mais protegidas ficam.

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